O assunto das cotas raciais aprovadas na semana passada pelo Supremo Tribunal Federal já está meio batido, mas, por sua importância, retorno a ele.
Como escrevi numa coluna para a edição impressa da Folha, o filósofo John Rawls (1921-2002) propõe um experimento mental para determinar o que é justo. Você e seus concidadãos estão na posição original. Na melhor tradição contratualista, ganharam o direito de definir as regras sob as quais seu país vai funcionar. Como convém às democracias, virarão normas os princípios com os quais a maioria concordar. Há, porém, um detalhe importante. No momento de votar, ninguém sabe que lugar ocupará na sociedade, quanto dinheiro ou status terá, sua origem étnica, nem seu grau de inteligência, força física ou beleza. Esse filtro, que Rawls chamou de véu da ignorância, assegura que as escolhas serão ao mesmo tempo imparciais e racionais.
Bem, eu apliquei esse teste às cotas, mas receio que ele não tenha me levado muito longe. Quer dizer, levou-me até um ponto meio óbvio, com o qual, creio, a maioria dos contratantes concordaria, que é a necessidade de criar uma espécie de seguro contra injustiças flagrantes. Ações afirmativas contra o racismo se encontram por certo nessa categoria. Mas não apenas elas. Boa parte dos serviços prestados pelo Estado, como a saúde e a segurança públicas, constituem, se quisermos, um tipo de "hedge" contra eventos aleatórios. Viver em sociedade é criar estruturas colaborativas através das quais as pessoas ajudam umas às outras, mesmo que os custos não sejam repartidos de forma idêntica entre todos.
Leia mais (03/05/2012 - 07h07)
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